Pianola

Comment

Pianola

A pianola é na verdade um piano que possui dispositivo para executar automaticamente a música, por meio de pedais e alavancas manuais. O mecanismo original, patenteado em 1897 pelo engenheiro americano Edwin S. Votey, era instalado diante do teclado e consistia num rolo de papel perfurado com a notação da peça que se pretendia executar, accionado pelos pedais. Cada perfuração baixava uma tecla e impulsionava o respectivo martelo, o que substituía as mãos. Mais tarde o mecanismo foi incorporado ao instrumento, que passou a possibilitar uma considerável variação de dinâmica e andamento.

Foram várias as obras e estudos que este instrumento inspirou, veja-se a Toccata de Hindemith, por exemplo, composta no ano de 1926.

Vários foram os músicos que escreveram peças sem cuidado, dadas as limitações impostas pelo tamanho da mão do executante.

Este instrumento musical também é conhecido como piano mecânico.

 Contudo, o sucesso que a pianola atingiu no início do século XX não foi mantido nas décadas que se seguiram e a sua projecção entre a recepção musical acabou por ser efémera.

A partir dos anos de 1990 os pianos mecânicos assumem grande notoriedade e a sua funcionalidade, à época, é um dos principais factores para a sua popularidade entre a recepção: estes permitiam a utilização dos dados armazenados numa disquete de computador e usando-os conseguiam  gravar e reproduzir com fidelidade uma execução em 'tempo real'.

Nota: Demonstração do funcionamento deste instrumento 

Fotografia: Rolo de papel perfurado com ''Fado da Granja'' de António Menano, que toca na pianola nesta demonstração

História Oral. 2014. Mural Sonoro. Nuno Siqueira.

Comment

José Luís Tinoco (músico: autor, pianista, compositor)

José Luís Tinoco (músico: autor, pianista, compositor)

71ª Recolha de Entrevista

Quota MS_00066 Europeana Sounds

 

Only with permission

Rights reserved - Free access

Pintura-de-José-Luís-Tinoco-Hot-Clube-1954.jpg

ilustração de José Luís Tinoco no ano de 1954, feita na Cave do Hot Clube, Lisboa

© 2013 Perspectivas e Reflexões no Campo

Luís Cilia (músico, compositor)

Comment

Luís Cilia (músico, compositor)

64ª Recolha de Entrevista

 

Quota MS_00041 Europeana Sounds

Nota: Projecto da RTP on-line Extrema-Esquerda: porque não fizemos a revolução?, temáticas do filme O Salto, por Soraia Simões, aqui »»»

Nota importante: Em Março de 2017 relembrava a Luís Cilia o concerto “La Chanson de Combat Portugaise”, do qual a RTP, cumprindo a sua missão de serviço público, disponibiliza agora uma boa parte no seu arquivo on-line* (1), hoje recebo uma mensagem do Luís «Soraia, tem o (ignóbil) panfleto que esse grupo distribuiu à entrada da Mutualité? Se não tem posso enviar-lhe (...)». «Envie-me Luís. Adorava ver isso». E aqui está ele, servindo-me no trabalho e cumprindo (me) também na minha missão.

O panfleto é assinado pelo Comité «Viva a Revolução, mas Proletária». (1)*RTP Arquivos** aqui »»»

para mais detalhes acerca deste documento, contacte-me

Comment

Milton Gulli (Philharmonic Weed, Cool Hipnoise, Cacique' 97)

Comment

Milton Gulli (Philharmonic Weed, Cool Hipnoise, Cacique' 97)

15ª Recolha de Entrevista

Only with permission

Rights reserved - Free access

Quota MS_00018 Europeana Sounds

© 2013 Perspectivas e Reflexões no Campo

Som, Pesquisa, Texto: Soraia Simões

Fotografia: Hugo Valverde no âmbito do Ciclo «África Move» com direcção artística de Soraia Simões de Andrade a convite de Colecção B para o Festival Escrita na Paisagem em Évora no ano de 2012

Nota de autora:

O tema ‘Kodé’, do fonograma Karam de Kimi Djabaté (ouvir 14ª recolha), foi composto por Milton Gulli e gravado pelos Cacique´97, incluindo-se depois a kora do músico Brahima Galissa e a voz e balafon de Kimi Djabaté.
Além do disco Karam de Kimi Djabaté, o tema acabou por figurar no disco de Cacique´97.

Milton explica à parte desta recolha que: o tema foi composto por mim para o primeiro disco de Cacique´97. Na altura eu tinha escrito uma letra que pedi a um amigo guineense para traduzir. Mas, quando chamámos o Kimi para cantar, a letra não encaixava no tema. O Kimi acabou, então, por sugerir outra letra, que acabou por ficar.

Entretanto, eu peguei na letra do Kimi e traduzi algumas frases para 'chuabo' (língua da zona de Quelimane), com a preciosa ajuda da minha avó, e é essa parte que eu canto no tema.

Comment

Músico Profissional que futuro?

Músico Profissional que futuro?

O papel do músico, independentemente das práticas musicais e performativas que produz na sociedade actual, tem-se cruzado com dois géneros de intenções discursivas: as indispensáveis e as acessórias.

Indispensáveis; as clarificadoras, explicativas, com metodologias que trabalham na aproximação entre a sua actividade e os círculos de interesse, que o poderão trazer mais perto de um estádio de relação unicamente com aquilo que trabalha/faz (música) diminuindo tensão e fosso entre a importância do que faz e o público; acessórias as que sob o artifício da linguagem negligenciam a sua profunda compreensão e favorecem os compartimentos estanque.

A música, nos processos de apropriação, legitimação de discursos em seu redor e transmissão foi requerendo, cada vez mais, um empreendimento reflexivo em relação aos compromissos socio-musicais, etnomusicológicos, técnicos e antropológicos. Empreendimento que, sobretudo a partir dos anos de 1980, deixou claramente de interessar à maioria dos veículos de mediatização. O fosso entre a realidade no campo musical e musicológico – com os seus intervenientes – e a recepção – com seus consumidores, públicos alvo – dada a escassez empreendedora presente nos agentes de difusão, procurados por ‘esse’ público, agigantou-se.

Foram perdendo os músicos profissionais, tem perdido algum público, aumentando o seu desconhecimento, ganharam as retóricas de costumes e cultura de uma ‘estética musical’ que favoreceram o ressurgirmento dos opinares de bancada agarrados ao descortinar único e pouco fundamentado do produto final (o fonograma), saltaram para as salas de espectáculos os ‘fenómenos sónicos urbanos’ e os portugueses foram-se habituando, condizendo com a ilusão informativa musical difundida, a ser os principais produtores da ausência do músico como profissional nas salas de espectáculos, convencidos que estão dos ‘poderes’ e ‘saberes’ dos meios com que julgam andar informados sobre os seus ‘artistas ou entertainers de eleição’.

A desresponsabilização e falta de compromisso com o profissional músico, submetido a um esquema labiríntico quádruplo – disseminação fonográfica, agências/produtores, media, público, nem sempre o beneficiou ou beneficia.

A destituição do músico enquanto profissional deveu-se, em grande parte, a um significativo aumento de conceitos sem ligação ao âmbito
musical, que acomodaram as suas retóricas em noções abstractas implícitas como: o entertainer, o que serve para animar, o que pode ser enaltecido ou destituído das suas funções por alguém que sabe menos que ele em graus de avaliação que se prendem com um ‘gosto’ ou uma ‘cena musical’. O aumento de uma crítica desinformada, desinteressada, paralisada num escrutínio de artefactos sem ligação à génese do som e música produzidos, ao músico, à sua intervenção, aos recursos tecnológicos de produção, aos materiais, circunstâncias e espaços em que opera alastrou aos novos meios de mediação informativa como a internet.

Se por um lado, há quem o faça com critérios que dizem respeito à música e ao seu criador, executante, intérprete, por outro lado há quem o faça sem esse método, ora pela escassa mediação de saberes ora pela irreflexão ou falta de prudência no que respeita ao tratamento que lhes foi sendo atribuído: ao músico e à música que faz.

Mas, é também ao músico que cabe a defesa dos seus interesses, zelando pelo prestígio da ‘classe’, pelo melhoramento das instituições musicais e, em geral, pelo que interessa ao colectivo, rejeitando contratos propostos por pessoas ou instituições não credenciadas, inteirando-se de tudo quanto for necessário no que se trata de serviços prestados dentro ou fora do seu país, na aplicação da sua ‘arte/prática’ em prol da educação, no incentivo e alerta para a recriação e cultura do povo, da integração no mesmo espaço comunitário de partilha publicando teses musicais e apreciações críticas, etc. Porém, provocar ou entreter debate que não seja de interesse da colectividade ou do beneficiamento da sua actividade no campo musical em que actuar, não usar os órgãos de difusão, nos quais não revê a evolução da classe, como promoção, não deverá ter qualquer
receio de desagradar a outrem, ou incorrer em impopularidade no cumprimento e dignificação da sua profissão. Em suma, a importância da sua função não poderá permitir abusos sobre a condição económica de
quem contrata, nem o proveito que dele possam usufruir socialmente em quadrantes que lhe são alheios, tem de ser reconhecido no âmbito das suas funções em valor monetário sempre, em prestações de serviços não pagas em prol de causas sociais ou outras de seu interesse, se o entender.

O estudo e a compreensão de processos, situações e estratégias utilizados para a transmissão de saberes musicais em Portugal urge, se um etnomusicólogo, ao trabalhar com uma determinada tipologia no terreno (género/estilo/cultura) de música, vê-se diante da necessidade de compreender de que forma os saberes musicais relacionados ao campo abordado são valorizados, seleccionados e transmitidos culturalmente,
porque não aproximar o músico de um campo de acção onde ele é abordado como profissional e não um animador de ocasião? Porque não fruir de espectáculos, fonogramas ou, tendo essa vontade e possibilidade, do contacto/experiência com instrumentos musicais em aulas, de forma a que a valorização da actividade do músico, como aqui é sugerida seja alcançada?

O acesso facilitado à fruição, opinião e aproveitamento desta profissão poder-se-á tornar cada vez mais problemático para o músico e tal facto permanece, infelizmente, conectado com esse facilitismo que o etnomusicólogo Bruno Nettl resumiu de modo esclarecedor na sua célebre frase: “o modo pelo qual uma sociedade ensina sua musica é um factor de grande importância para o entendimento daquela música*” (NETTL,1992: 3).

*NETTL, Bruno. Ethnomusicology and the teaching of world music. In: LEES, Heath. Music
education: sharing musics of the world. Seul: ISME, 1992.

Notas:Texto originalmente publicado em Revista CAIS 

Vídeo correspondente a uma Sessão Mural Sonoro no Museu da Música no ano de 2013

Pedro Calasso (músico, construtor. São Paulo)

Pedro Calasso (músico, construtor. São Paulo)

23ª Recolha de Entrevista

Quota MS_00064 Europeana Sounds

Only with permission

Rights reserved - Free access

 

© 2013 Perspectivas e Reflexões no Campo

Fotografia: Billy Rodrigues

Marta Miranda (OqueStrada)

Comment

Marta Miranda (OqueStrada)

32ª Recolha de Entrevista

                                                                                                                                     Only with permission

Rights reserved - Free access

Quota MS_00017 Europeana Sounds

© 2013 Perspectivas e Reflexões no Campo

Fotografia de capa: Augusto Fernandes no âmbito do Ciclo de Debates e Colóquios  Mural Sonoro organizado por Soraia Simões de Andrade no Museu da Música em 2013 com o tema: «Viver a Música a Partir da Periferia (?)» que contou com Marta Miranda, o rapper e sociólogo Chullage (Nuno Santos) e António Avelar Pinho (Banda do Casaco, Filarmónica Fraude)

Comment

Guitarras de Coimbra e Lisboa, breves notas

Comment

Guitarras de Coimbra e Lisboa, breves notas

Página de Facebook conferida à obra de Raul Simões (Guitarra de Coimbra construída por Raul Simões.

Página de Facebook conferida à obra de Raul Simões (Guitarra de Coimbra construída por Raul Simões.

imagem (Guitarra de Coimbra construída por Fernando Meireles)

imagem (Guitarra de Coimbra sem o fundo construída por Óscar Cardoso)

imagem (Guitarra de Coimbra sem o fundo construída por Óscar Cardoso)

O instrumento que hoje chamamos guitarra portuguesa assumiu, até ao século XIX, por toda a Europa nomes como: cistre (França), cetra e cetera (Itália e Córsega), Cítara (Portugal e Espanha), Cittern (Ilhas Britânicas), cister e cithern (Alemanha e Países Baixos).

A afinação nominal, ainda hoje usada na guitarra, mantém características das cítaras do Renascimento (as mesmas relações intervalares).

A guitarra apresenta-se hoje em dois modelos diferentes. A de Lisboa (mais aguda) e a de Coimbra (mais grave). A diferença tímbrica de ambas é notória e tal facto deve-se não só às diferenças da sua construção como da sua execução, além da diferença, já mencionada, de tessitura (mais aguda/mais grave).

A afinação nominal é então, do agudo para o grave, a seguinte: si (3), lá (3), mi (3), si (2), lá (2) , ré (2) no caso da Guitarra de Lisboa e lá (3), sol (3), ré (3), lá (2), sol (2), dó (2) no caso da Guitarra de Coimbra.

Curiosidade: Entre as mais variadas perspectivas, e teses, acerca de Guitarreiros em Coimbra difundidas nos meios de comunicação, mas também académicos, não consta a obra de Raul Simões, um dos primeiros guitarreiros de Coimbra e construtor de Artur Paredes.

Raul Simões tinha por profissão marceneiro, dedicando-se à construção e reparação de instrumentos de cordas na oficina da sua residência, cita na Rua Dr. Felipe Simões, nº 9, Bairro de Santana. Para António Nunes, Raul Simões tem sido referenciado como o último grande violeiro de Coimbra, “elogio que também enuncia um lamento sobre práticas artesanais em vias de desaparecimento no tecido urbano de Coimbra pela década de 1970”. Armando Simões, na sua obra A Guitarra. Bosquejo histórico descreve com pormenor a morfologia da antiga guitarra de Coimbra (toeira), não evidenciando “o papel desempenhado por Raul Simões nem individualizando o novo modelo de guitarra, que se implantou decisivamente na Academia de Coimbra na década de 1950” (Manuel Nunes). Nesta obra, publicada em 1974, o autor refere: “Raul Simões – actualidade – é o único guitarreiro existente em Coimbra. Não começou pela arte, mas fez-se um bom guitarreiro como construtor e restaurador de instrumentos de corda, inclusivamente, instrumentos de arco” (Simões, 1974:130). Na obra “No rasto de Edmundo de Bettencourt. Uma voz para a modernidade”, publicada em 1999, António Nunes refere o papel de Raul Simões na reforma da Guitarra Toeira na década de 1920, precisando que “quando Joaquim Grácio toma contacto com esta realidade, as linhas de força reformadoras do instrumento já estavam basilarmente enunciadas por Artur Paredes e Raul Simões”. Após o estudo sobre a vida, obra e legado de Bettencourt, António Nunes e José dos Santos Paulo deram continuidade a recolhas sobre outros importantes artistas da cidade de Coimbra. Na obra Flávio Rodrigues da Silva. Fragmentos para uma guitarra reproduziram uma imagem da guitarra associada à oficina de Raul Simões e uma ficha técnica com detalhes de construção. As guitarras de Raul Simões estão ainda associadas a executantes como Flávio Rodrigues da Silva, Peres de Vasconcelos, Afonso de Sousa, António Carvalhal e Artur Paredes, entre outros. A guitarra toeira de Coimbra da década de 1920, com a qual Artur Paredes fez gravações para a voz de Edmundo Bettencourt (1927), actualmente exposta no Museu Académico, representa um instrumento fundante e revolucionário, mediante o qual Artur Paredes instaurou pioneiramente o ADN da Guitarra de Coimbra, e foi com ela que Afonso de Sousa gravou as suas próprias peças instrumentais em 1929. Em 1953 Petrónio Ricciulli comprou uma guitarra de Coimbra de 22 trastos a Raul Simões, instrumento que inicialmente fora uma encomenda feita por Artur Paredes, episódio que poderá justificar a ruptura entre Raul Simões e Artur Paredes.
Nos finais da década de 1950, Raul Simões gravou para a Alvorada duas faixas com a cantadeira conimbricense Estrela Abrantes (EP Alvorada, 60.133, 1959); Lado 1 Grupo de Silvares, com os temas: “Que Diacho” e “Farrapeira”. Lado 2 Raul Simões (viola toeira) e Estrela Abrantes (voz), temas: “Estalado” e “Vira de Coimbra”. Como singular executante da arte do toque popular da Viola Toeira, Raul Simões recebeu na sua oficina Ernesto Veiga de Oliveira em 1965, que fixou breves apontamentos de afinação da viola e de exemplificação do toque. Raul Simões interpreta trechos do “Estalado” e do “Vira”, utilizando notável toque misto à base de ponteio, rasgado e percussão. Os originais das gravações estão arquivados no Museu Nacional de Etnologia, em Lisboa, no arquivo sonoro que serviu de base ao livro Instrumentos Musicais Populares Portugueses. Em 2001, o Prof. Domingos Morais orientou a digitalização destas recolhas, acessíveis online: http://alfarrabio.di.uminho.pt/arqevo/arqetnoevo.html. Num artigo do Jornal de Coimbra, “Raul Simões, o último tocador de viola toeira”, Manuel Dias, salienta: “Raul Simões faleceu levando consigo um património imaterial de Coimbra Popular, da Coimbra dos Futricas, ficando-nos a grata recordação do seu talento”. Raul Simões faleceu a 4 de Novembro de 1981 na freguesia dos Anjos, em Lisboa.

Notas:

A GUITARRA DE COIMBRA (2019, RTP2), um filme de Soraia Simões

Um olhar sobre a Guitarra de Coimbra realizado por Soraia Simões [RTP]

Comment

Sanfona

Comment

Sanfona

(sanfona de Fernando Meireles, fotografada em Coimbra durante recolha de entrevista com o construtor e músico)

(sanfona de Fernando Meireles, fotografada em Coimbra durante recolha de entrevista com o construtor e músico)

15186_587509204601688_555203868_n.jpg

A sanfona pertence à família dos cordofones. Parecida, do ponto de vista sonoro, com um violino com bordões produz um som usado ritmicamente por meio de uma corda apoiada numa ponte móvel (a mosca), e pela fricção das cordas através de uma roda com resina, por via de uma manivela, e a sua melodia é criada através de um teclado.

O som produzido por este instrumento assemelha-se a um cruzamento entre um violino, por ser de corda friccionada e possibilitar melodia, e uma gaita-de-fole, por ter bordões, por intermédio de outras cordas que apenas reproduzem uma nota pedal (ou seja uma nota continuada).

Alguns textos de mestres organeiros afirmam que a sanfona surgiu no século XI, d.C., no norte da Península Ibérica. Embora alguns investigadores na área de especialização em História Medieval reapontem o seu ‘surgimento geográfico’ para o Norte de África.

A sua forma mais arcaica conhecida é o organistro (também conhecido pela designação em latim, organistrum), um instrumento de grande dimensão em corpo de guitarra, que continha apenas uma corda de melodia e que cobria uma oitava diatónica, e dois bordões sem a ponta móvel ainda.

Este instrumento, devido ao seu tamanho, exigia ser tocado por duas pessoas por duas fases em simultâneo: em que uma friccionava as cordas e a outra tocava a melodia pretendida. Este acto consistia em puxar para cima barras de madeira ao longo da escala que, com pinos a meio, encurtavam a corda de modo a obterem diferentes notas. As melodias tocadas eram lentas devido ao esforço associado à tentativa da sua execução.

Com a introdução do órgão, caiu em desuso nos locais de culto, no século XII. A sanfona passa então a ser usada pela nobreza, trovadores, jograis e pelo povo. Com o passar do tempo, mendigos, cegos e vagabundos usam-na para tocar nas ruas e em feiras. No final do século XIX o instrumento entra em decadência, tendo quase desaparecido totalmente. Em Portugal perdurou até princípios do séc. XX, extinguindo-se.

(Fernando Meireles à conversa com Soraia Simões no âmbito deste projecto, categoria: História Oral, fotos de António Freire) Fernando Meireles em execução de 'Bailinho da Madeira' com Sanfona

(Fernando Meireles à conversa com Soraia Simões no âmbito deste projecto, categoria: História Oral, fotos de António Freire)
Fernando Meireles em execução de 'Bailinho da Madeira' com Sanfona

Em 1966, Ernesto Veiga de Oliveira escrevia: «Entre nós, da sanfona queda rara lembrança, e já apenas como instrumento de feira, cada vez mais raro, ao serviço de mendigos e cegos que, sem a saberem tocar, a envelheceram e desacreditaram; e é neste aspecto final que a memória dela se fixou (…)». Fernando Meireles (músico do grupo Realejo, construtor de instrumentos e artesão) pesquisou sobre este instrumento durante muito tempo e dedicou-lhe horas de trabalho, fê-lo renascer e valorizou-o de novo.

O instrumento que no século XIX desaparecera do universo musical português passou a fazer parte do quotidiano de Fernando Meireles Pinto, com um labor de critérios impares, recuperou, reconstruindo-o a partir de diversas fontes, nomeadamente das figuras de presépio dos séc. XVII e XVIII, da autoria do escultor Machado de Castro. Na 62ª recolha de entrevista realizada no âmbito deste trabalho, o músico-construtor, que ao fim de cerca de duas décadas permanece num dos corredores da Associação Académica de Coimbra com a sua oficina-Atelier, relembrou não só o seu percurso como o tempo da sua aproximação à sanfona e as emoções experimentadas ao longo de todo o seu percurso de descoberta e reconstrução do instrumento.

Com anos de trabalho consagrado à feitura de instrumentos, e encomendas várias de músicos como Pedro Caldeira Cabral ou Julio Pereira, as sanfonas, concertina, viola braguesa, bandolim e cavaquinhos tocados no grupo do qual faz parte – Realejo – sairam todos da sua oficina. Fernando Meireles tem o seu trabalho reconhecido em vários pontos do mundo, como a Casa Real Espanhola onde se encontra uma guitarra por si construída, o seu trabalho de recuperação da sanfona foi inequivocamente elogiado por colectores, destaco aqui o médico-psiquiatra de Coimbra Louzã Henriques, que tem dedicado mais de três décadas da sua vida ao coleccionismo e pesquisa de instrumentos tradicionais.

 

Vídeo em baixo: Recolha, adaptacão e arranjos de Janita Salomé
Vozes de Vitorino e Janita Salomé
Sanfona por Carlos Guerreiro

adenda: Carlos Guerreiro (entrevista, September 20, 2013, História Oral), construtor e músico (um dos mentores do colectivo Gaiteiros de Lisboa) construiria, igualmente, uma sanfona procurando (re) introduzir este instrumento, à semelhança de Fernando Meireles, noutros campos das música e cultura populares.

Comment