Violeiros nos Açores

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Violeiros nos Açores

No texto que aqui escrevi acerca da viola de corações referi que em breve lhe deixaria  um levantamento acerca de alguns violeiros, artesãos desta ilha, que até finais do século XIX construíram e transmitiram a arte de construir a viola da terra de modo ora profissional ora amadorístico. 

 

Convém não esquecer que a viola açoriana tem hoje uma representação em Museus, Colecções particulares, tanto da região autónoma dos Açores como em várias regiões de Portugal continental. Museu de Vila Franca do Campo, Museu Carlos Machado em Ponta Delgada, Casa-Museu Dr Armando Côrtes-Rodrigues em Ponta Delgada, Museu de Angra do Heroísmo, Museu de Arte Sacra e Etnografia da Ribeira Chã,  Museu Etnográfico das Flores ou coleccionadores e tocadores com considerável espólio pessoal como Miguel Braga Pimentel em Ponta Delgada ou, em exemplo,  José Lúcio Ribeiro d’Almeida e Luís Manuel Carreira Garcia ambos em Lisboa.

 

Por sentir que a maioria dos nomes divulgados no campo da construção e organaria no que respeito dizia a estas violas se concentram nos século XX e XXI e por temer que os artesãos que contribuíram para a sua transmissão permanecessem, salvo algumas pequenas excepções, no esquecimento, na minha pesquisa para este item usei algumas fontes bibliográficas, catálogos de Museus, na minha pesquisa anterior baseei-me na interpretação de  impressões sobre instrumentos musicais e sua feitura de coleccionistas privados com quem conversei durante o trabalho no Mural Sonoro, seja presencialmente: como quando o fiz em Coimbra com o médico-psiquiatra Louzã Henriques, seja por via electrónica com pessoas como Maria Fraga ou o formador e tocador Rafael Carvalho. 

Como prometido, destaco então nesta área do Portal alguns dos dados que vou acumulando neste trabalho, ou seja os seguintes violeiros, bem como as respectivas fontes através das quais fui tendo acesso a alguma informação relevante especialmente no ano de 2013 :

.‘’Catálogo da Exposição de Arte, Ciências e Letras Micaelenses’’ inaugurada a 7 de Maio de 1882 no extinto edifício Convento da Graça: Linhares (violeiro em Ponta Delgada — uma rabeca, Luís A.B Arruda), Luís José Nunes Jr. (uma guitarra — Licínio Tavares), Luís José Nunes Jr. um cavaquinho — António M. de F.Mais). 

.Luís José Nunes, construtor de instrumentos de corda, distinguido co uma menção honrosa de primeira classe na Exposição Distrital de Ponta Delgada do ano de 1895 e premiado com uma medalha de ouro na Exposição de Indústrias Artes e Ciências de Ponta Delgada do ano de 1901. De ressalvar que no ano de 1989 Maria Luísa Vasconcelos Van-Hoof doou ao Museu Carlos Machado uma guitarra deste fabricante onde consta alguma desta informação.

.Joseph S.Castanha&Sons, All Kind of String Instruments, Fan&Silva of the best quality, Brass and Nickel Plating, em Boston — onde se concentra uma  considerável comunidade de violeiros oriundos do arquipélago dos Açores, cujo nome aponta a sua possível origem.

.Mariano Jacinto de Melo, Miguel Jacinto de Melo (conhecido por ‘’mestre Charuto’’ e filho de Mariano Jacinto de Melo), Adelino Vicente (1935 — 15 de Dezembro de 1999), João Vieira Pacheco (conhecido como ‘’mestre Formiga’’), António José de Sousa Melo (filho de Miguel Jacinto de Melo — emigrado) todos da Ilha de São Miguel, Vila Franca do Campo mais concretamente.

.José de Medeiros, António de Medeiros (filho de José de Medeiros — emigrado), Manuel de Medeiros (filho de António de Medeiros, conhecido por ‘’Breta’’) todos da Ilha de São Miguel, mais concretamente São Roque.

.José Luís Nunes, Miguel de Braga Pimentel, Fernando Manuel Oliveira Raposo, Dinis Raposo, Jacinto d’Oliveira (conhecido por ‘’Galocha’’) todos oriundos de Ponta Delgada.

.Nemésio José Pimentel da Silva e o seu pai João Barbosa da Silva (conhecido por ‘’mestre João Miguel’’) de Bretanha.

. Amorim de Sousa Massa de Arrifes

.António Pombal de Lagoa

.Manuel Viveiros Rego (conhecido por ‘’Marcolino’’) de São Vicente Ferreira

.Hugo Raposo de Pico da Pedra

.Manuel Flora Mendonça de Lomba da Fazenda

 

Mas, não só a ilha de São Miguel concentra um número de construtores-fabricantes, unidos pelas relações de fortes laços familiares e aprendizagens que foram passando através da oralidade sobretudo entre pais e filhos,  de cordofones característicos no arquipélago açoriano, também as Ilhas Terceira, Faial, Pico e Graciosa concentram nomes importantes neste capítulo, a saber:

.Manuel Augusto Lobão (10 de Abril de 1908 — 5 de Agosto de 2006), João de Sá e Silva, José Augusto Lobão (filho de Manuel Augusto Lobão. 30 de Julho de 1937 — 12 de Julho de 2004), Carlos Rodrigues, Ernesto da Costa da Ilha Terceira.

.Manuel Goulart Garcia, Francisco Pinheiro, Guilherme Henrique Bettencourt da Ilha do Faial.

. ‘’Caniço’’, epíteto para Manuel Rodrigues Amaral (nome real) da Ilha do Pico.

.Citrino da Cunha Santos e Juventino Ávila (‘’mestre ou professor José Juventino’’ como é carinhosamente apelidado da, ambos da Ilha Graciosa.

 

outras referências bibliográficas e documentais usadas na pesquisa: Documentação, Monogramas, Museu Machado Castro, Leite de Ataíde, Etnografia, Arte e Vida dos Açores, Vol II, pág.  327, 328 e 329, Documentação/Colecção de Maria António Esteves — Vila Franca do Campo, Dicionário de Música, Almanach Popular dos Açores para 1870, Ponta Delgada, Typographia da Rua do Frias, número sete.

Fotografia usada na capa deste texto correspondente a encontro de violas em Ponta Delgada promovido pela RTP Açores. De Luciano Barcelos, publicada online no site RTP em 23/08/2011.

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Uma experiência do rap no Brasil na primeira pessoa. Breve consideração, por Dom Billy

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Uma experiência do rap no Brasil na primeira pessoa. Breve consideração, por Dom Billy

[ ver RAProduções de Memória Cultura Popular e Sociedade]

*Sou Brasileiro, de São Paulo, nasci num hospital da zona leste da capital.

Fui um dos pioneiros do hip hop no Brasil, fiz parte do conhecido grupo Funk Cia, ao lado de Nelson Triunfo no início da década de 1980.

Sou músico, compositor, dançarino, integrante do Projeto Preto Véio, um grupo musical que criei e que alberga vários ritmos brasileiros regionais, aliados a elementos musicais de cariz urbano como o rap

Nesse momento me encontro escrevendo um livro e preparando um Documentário sobre minha trajetória dentro da cultura hip hop no Brasil,  desde os ''bailes negros'' na cidade de São Paulo dos anos de 1970 até aos dias de hoje. 

De certo modo essa cultura mexeu com a auto-estima do jovem negro que vivia nas periferias da cidade, e buscava um meio de se integrar na juventude da sua época, encontrando o que dizemos hoje de 'identidade cultural' dentro de uma sociedade minada de preconceitos, e que vivia num regime de ditadura.

Segue aqui um pequeno trecho desse meu livro que em breve estarei lançando: 

Esta é a fase em que eu comecei a curtir os bailes mais nervosos de São Paulo. Chic Show no Palmeiras e Zimbabwe no Guilherme Giorgi eram os bailes que eu mais freqüentava. Vi inúmeros shows no Palmeiras. Foram muitos e inesquecíveis. 

 A Chic Show foi um verdadeiro império na produção de bailes e shows, no seguimento de Baile Black, aqui no Brasil. Realmente ela ditou uma tendência desde a sua criação nos anos 70. A princípio era apenas um hobby entre irmãos que curtiam dar bailes na casa dos amigos, e se tornou uma empresa de linha de frente. Trouxe para o Brasil alguns dos nomes do primeiro time da música negra norte americana: Jimmy “Bo” Horne, Cheryl Lynn, Chaka Khan, James Brown, Glória Gaynor, Roger Troutman, Koll Moe Dee, Kurtis Blown, Whodini, Cash Money, Too Short, só para citar alguns internacionais.

Seus DJ’s foram verdadeiras lendas e são lembrados, até hoje, com saudade e respeito. Kitão e Natanael Valêncio foram personagens que embalaram uma geração de amantes da música negra.  E tudo isso acontecia numa época em que o DJ ficava escondido - dentro da cabine. Ele tinha que ter um extremo bom gosto aliado a um alto conhecimento musical. Não fazia performances como hoje vemos. Ele era um ilustre desconhecido. Houve uma época anterior aos anos 80, na qual os DJs eram simples executores de músicas. Os mais famosos eram os que trabalhavam nas rádios como locutores. 

Com suas vozes bonitas entravam nos lares, e faziam a alegria das empregadas domésticas, dos taxistas, das donas de casa em seus afazeres ou simplesmente para as pessoas que ouviam os programas de rádios a fim de ouvir uma música que lhes agradasse o coração. Nos bailes o papel do DJ também era o de tocar as músicas, mas de uma forma que mantivesse o público animado com a seqüência musical, ou seja, a pista não poderia esvaziar. 

Hoje, a pista ainda tem que continuar cheia, mas o conceito de DJ mudou e muito. Atualmente o DJ é um show-man, uma celebridade. Ele se tornou uma atração a mais num baile, são mestres de cerimônia, verdadeiros especialistas na arte de manter a pista cheia, com suas exibições performáticas e equipamentos de última geração. Creio que seja por isso que esta dupla Kitão e Natanael Valencio são reverenciados até os dias atuais. 

O perfil da massa, que curtia esses bailes, era muito especial. Os bailes eram muito esperados, pois, aconteciam uma vez por mês. Tínhamos de ter uma roupa exclusiva. No dia do baile os salões de cabeleireiros afro da Rua 24 de Maio, (no centro de São Paulo), bem como os dos bairros, lotavam de clientes. À noite, os ônibus que vinham dos bairros em direção à Rua Turiassu, 1840 (endereço do Ginásio do Palmeiras) eram tomados especialmente por essa Massa Black, muito animada, com seus cabelos afro “redondinhos” e elegantemente trajada para uma noite de sonhos, de embalos e de conquistas. Todos com a auto-estima nas nuvens e embalados por timbres lindos, grooves fantásticos e puro soul (...)

Links disponíveis:

 Nélson Triunfo: do Sertão ao Hip-Hop

 

*Dom Billy é rapper, escritor, compositor e foi dançarino de break-dance. Vive em Itaquera, um dos bairros periféricos distrito da zona leste cidade de São Paulo, no Brasil.

 

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Camané

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Camané

86ª Recolha de Entrevista

Quota MS_00069 Europeana Sounds

 

Perspectivas e Reflexões no Campo
Fotografias: Helena Silva
Realizada no LARGO Residências, Lisboa

 

 

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Carlos do Carmo (intérprete de fado)

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Carlos do Carmo (intérprete de fado)

84ª Recolha de Entrevista

Quota MS_00067

Europeana Sounds

 

Only with permission

Rights reserved - Free access

© 2014 Perspectivas e Reflexões no Campo

Fotografias: Helena Silva

Realizada em Lisboa na casa de Carlos do Carmo

 

 

 

 

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Viola Campaniça

Viola Campaniça

É uma das mais antigas violas populares ainda existentes. Típica da região do Baixo-Alentejo, durante algum tempo foi relativamente fácil encontrá-la desde a zona litoral até à raia e percorrendo ainda algumas franjas da região algarvia. Hoje, como reforça a conversa com o músico e divulgador Pedro Mestre, o mais comum e de um modo cada vez mais aceite é encontrá-la com grande dinamização, tanto do ponto de vista do ensino como  cultural, em Castro Verde.

Porém, a viola campaniça gozou outrora de satisfatória popularidade na animação de balhos (bailes cantados), despiques (nas tabernas), rodas e no acompanhamento de grupos corais (alguns deles mistos).

Cada tocador imprime o seu estilo interpretativo na execução, mas a afinação mais usada é: sol, mi, dó, fá, dó, embora também se possa usar outra mantendo contudo a afinação relativa entre cordas.

Este cordofone por norma arma com dez cordas de metal de cor amarela e aço em cinco ordens embora o cravelhal apresente doze cravelhas com a afinação já referida. Sobre a escala, rasa com o tampo, vêem-se dez pontos e dois ou três meio pontos suplementares sob as cordas agudas.

Na década de 1960 a viola campaniça entrou em desuso, voltando  na segunda metade da década de 1980 mas principamente nos anos de 1990/2000 a assumir o papel de destaque, especialmente em Castro Verde, que outrora tivera, como poderá mais tarde pesquisar no Colóquio-Sessão do Mural Sonoro que moderei em Março no Museu da Música com o Tema: «Cante Alentejano: a adaptação na Música Popular, o discurso sobre as identidades e o território» através dos testemunhos de José Francisco Colaço Guerreiro e Janita Salomé.

Ainda assim, durante a década de 1960 a viola conseguia manter alguma vitalidade entre um reduzido número de indivíduos que a tocavam na faixa ocidental da planície alentejana (zona do Alandroal).

Quanto aos materiais usados na sua construção habitualmente as suas ilhargas são feitas em madeira oriunda da Austrália, o seu tampo em pinho originário de Flandres, o seu braço em mogno e o seu interior em casquinha ou mesmo choupo enquanto a escala em pau-preto.

Pedro Mestre durante recolha de entrevista para Arquivo Mural Sonoro. Viola Campaniça construída por si no ano de 1999.

Pedro Mestre durante recolha de entrevista para Arquivo Mural Sonoro. Viola Campaniça construída por si no ano de 1999.

Pedro Mestre durante recolha de entrevista para Arquivo Mural Sonoro. «Carrilhões mecânicos» adaptados por si na construção da viola

Pedro Mestre durante recolha de entrevista para Arquivo Mural Sonoro. «Carrilhões mecânicos» adaptados por si na construção da viola

Fontes usadas na pesquisa: recolha de entrevista feita para Arquivo Mural Sonoro a Pedro Mestre; SARDINHA, José Alberto, Viola Campaniça - O Outro Alentejo.

Entrevista Integral  para Suplemento Cultural ESCAPE  do Jornal 'La Rázon'

Entrevista Integral para Suplemento Cultural ESCAPE do Jornal 'La Rázon'

Entrevista integral traduzida para  português de Jairo Marcos para Suplemento Cultural do Jornal da Bolívia La Razón (Edición Impresa)

Jairo Marcos (La Razón)  Que é o fado? Ou seja, como é que se pode definir brevemente esta música a uma pessoa totalmente estranha? 

Soraia Simões (Mural Sonoro) Como qualquer prática musical de matriz urbana é complexo defini-la em parcas palavras, sobretudo devido à sua mutação, permeabilidade com novos intérpretes, criadores, poetas, guitarristas e letristas, mas para quem tem curiosidade em conhecê-lo o melhor é ouvi-lo. As definições a respeito da sua significância são por norma feitas numa perspectiva indutiva e afectiva por parte dos seus intervenientes: os fadistas. E dentro dos mais diversos discursos há quem a ele se refira, do ponto de vista poético-literário mas também emocional, como uma canção popular identificativa da cidade de Lisboa e usando na adjectivação a respeito deste domínio frequentemente as palavras ‘’saudade’’ e ‘’destino’’. Mas, qualquer comunidade de prática tem um conjunto variado de valores expressos nos discursos que lhe imprimem conotações variadas, pelo que a sua definição é sempre redutora. Os aspectos e nomes que o enformam são o que, quanto a mim, melhor caracterizam o género: os fados tradicionais (o ‘’corrido’’, o ‘’menor’’ e o ‘’Mouraria’’), os poetas, letristas, criadores, intérpretes vários que carregam a sua história e ajudam à sua identificação. Esses são impreteríveis conhecer, além da evidência para a maioria dos estrangeiros que é Amália Rodrigues, como sejam: Hermínia Silva, Fernanda Maria, Beatriz da Conceição, Maria Teresa de Noronha, Jaime Santos, Martinho de Assunção, Raul Nery, Armandinho, Joel Pina, Fontes Rocha, Alfredo Marceneiro, Fernando Maurício, Lucília do Carmo, Linhares Barbosa, Carlos do Carmo, poetas e compositores que lhe imprimiram outras nuances como: David-Mourão Ferreira, Alain Oulman, Pedro Homem de Mello, Frederico de Brito, José Carlos Ary dos Santos, etc e outros contemporâneos e que ora fizeram crescer o entendimento sobre o género ora levá-lo para um mar convulso cheio de influências variadas de outros campos da música popular, e até erudita em alguns casos particulares, e com outras esferas de ouvintes/públicos, que foi alargando o espectro da recepção musical como: Mafalda Arnauth, Mísia, Aldina Duarte, Cristina Branco, Camané, Pedro Moutinho, Herder Moutinho, Carminho, Ana Moura, Jorge Fernando, Raquel Tavares, Jaime Santos Jr, Ricardo Rocha, Marco Oliveira, Ricardo Ribeiro, e autores de poemas e letras como: Maria do Rosário Pedreira, Manuela de Freitas, Tiago Torres da Silva ou José Luís Gordo entre tantos outros. 

Jairo Marcos (La Razón) Quais são os elementos chave de um fado? Estou a pensar por exemplo se é suficiente com uma letra qualquer e um bom fadista. Ou é necessário também uma atmosfera concreta, sempre uma guitarra, etc.? 

Soraia Simões (Mural Sonoro) Bom, a resposta a esta questão está praticamente dada em alguns dos nomes que refiro atrás, na pergunta anterior, mas há na realidade determinadas características que são a história e vivência deste universo: ser tocado com uma guitarra portuguesa, uma viola e uma voz, ter na sua estrutura poético-literária quintilhas, sextilhas, redondilhas maiores e menores, um leque de poetas e letristas que o vão mantendo vivo e interessante dentro e fora da comunidade de prática. De qualquer modo, dada a sua transversalidade, temos exemplos de gente do fado que não obedece a estas características de um modo estaticista e mesmo assim fez ou faz fado. O caso de Rão Kyao que tocou saxofone e flauta em discos de fado ou, entre outros, o caso do piano usado neste universo musical como, entre outros no passado, o fez recentemente o pianista Júlio Resende de um modo bastante interessante. 

Jairo Marcos (La Razón) Reflecte o fado o caráter português? É a melancolia do fado mais uma projeção da forma de ser dos portugueses em geral? 

Soraia Simões (Mural Sonoro) Reflecte, como qualquer outra prática musical em Portugal, características dos indivíduos que o compõem e nele cooperam há um largo tempo. Mas, há fados mais melancólicos, outros mais alegres, outros jocosos, há até os reivindicativos. Como qualquer prática musical e cultural atenta sobre as vivências das pessoas que o habitam. E essas pessoas têm características sociais, humanas, estéticas e ideológicas que variam. O fado, como qualquer género, reflecte isso: essas vivências, essas emoções.

Jairo Marcos (La Razón) Falamos em todo caso de uma música de classes? Ou seja, é uma música hoje universal mas com origens populares, origens que continuam presentes atualmente nas suas letras? 

Soraia Simões (Mural Sonoro) Como qualquer música popular, dada a mutabilidade das sociedades, agentes e executantes que dela fazem parte, congrega todo o tipo de grupos sociais e isso reflecte-se nas letras e no modo de interpretar, tocar e até na gravação.

Jairo Marcos (La Razón) Como é que se define o momento actual do fado? Estou a pensar por exemplo na aposta de Ana Moura com ‘Desfado’. Significa que o fado está a evoluir e que também pode ser alegre?

Soraia Simões (Mural Sonoro) Mas, o fado, como disse há pouco, sempre foi tudo isso: alegre, triste, comovido, displicente, eloquente, telúrico, jocoso e mais adjectivos que lhe queiram colocar. Basta escutar alguns dos nomes que lhe referi na resposta às perguntas antecedentes para reparar que ele sempre teve tudo isso e muito mais. 

Jairo Marcos (La Razón) O fado foi declarado Património Imaterial da Humanidade. Quais são as consequências disto? Por quê é importante? 

Soraia Simões (Mural Sonoro) Acho que ele continuará vivo como sempre esteve, profissionalizante como sempre foi, a questão da candidatura veio especialmente permitir estudá-lo, contextualiza-lo e conseguir com que uma das práticas culturais e musicais mais expressivas em Portugal não fosse encarada num plano de secundarização. Veio, quanto a mim, apenas reforçar o seu interesse para a vida dessa comunidade (a artística e a da cidade de Lisboa sobretudo) tornando-a um objecto de interesse para a sociedade portuguesa e para a vida cultural dessas comunidades.

La Razón (Edición Impresa) / María Ángeles Fernández y Jairo Marcos, Reportagem, 06 de Abril de 2014

Viola de boca redonda

Viola de boca redonda

No que respeito diz às violas predominantes no arquipélago dos Açores já aqui lhe falei escrevendo da viola de corações, mas há ainda três tipologias de violas de boca redonda pelas ilhas açorianas: a viola de cinco parcelas, que arma com doze cordas e integra dois ou três bordões, a viola de seis parcelas, que integra quinze cordas, distribuídas em três parcelas de duas cordas e três parcelas de três cordas e a viola de sete parcelas, que integra dezoito cordas e que apresenta dificuldades no que concerne à sua afinação, execução e funcionalidade para o tocador, o que talvez justifique a sua raridade e o seu desuso.

Se na viola de corações a escala é composta por vinte e um trastos, doze deles no braço e nove deles sobre o tampo, na viola de boca redonda o número de trastos é variável bem como a forma como eles são distribuídos: doze deles sobre o braço na viola de cinco parcelas e dez deles na viola de seis parcelas, sem esquecer que elas ainda se distinguem e diferenciam de violeiro para violeiro no número dos restantes trastos sobre os tampos.

A viola composta por quinze cordas e conhecida na ilha Terceira por viola de seis parcelas tem o braço mais curto e uma caixa de ressonância mais larga. Tem dez trastos sobre o braço e entre sete e nove sobre o tampo.

Consta que os violeiros da família do Lobão imprimiam uma flor no extremo da pá da viola, uma prática que era comum em vários países europeus em que se esculpia uma flor ou figura do sexo feminino.

Quanto à discussão sobre a sua origem, existem variadíssimas referências quanto à origem da viola de seis parcelas, pelo que dada a não consensualidade e até controvérsia em torno deste capítulo não o abordarei aqui, sem contudo deixar de referir que entre as variadas teses consta a de Francisco José Dias em Cantigas do Povo dos Açores que na página 53 reflecte sobre a possibilidade de influencia por parte da presença castelhana no arquipélago durante os séculos XVI e XVII respectivamente. Há ainda quem refira a proximidade com o violão e a possibilidade da viola de boca redonda se ter deixado influenciar por esse instrumento musical, pedindo de empréstimo a ele o bordão mais grave (nota ''mi'') e as dimensões maiores da caixa de ressonância.

Em O Baile Popular Terceirense, Machado Drumond que se dedicou ao estudo do folclore na ilha Terceira aborda a presença frequente  dos tocadores em quase todas as freguesias rurais da ilha ainda no início do século XX. Munidos da respectiva viola de cinco parcelas e de dezasseis pontos, suspensa do antebraço esquerdo pelas salientes cravelhas.

É  de salientar que também no encordoamento destas violas há uma variação consoante o tocador e a ilha em que são tocadas. Há uma abrangente variedade de métodos, de cordas e combinações, que lhe mostrarei num outro texto respectivo aos diferentes modelos, construtores, métodos de execução e aprendizagens.

A fotografia que destaco foi cedida por  Maria Antónia Fraga Esteves e pertencem à sua colecção.

São ambas violas  terceirenses. A primeira, do lado esquerdo, mais pequena (parece maior mas não é) foi construída por Ernesto da Costa, Vale Farto, Terceira; é uma viola de cinco parcelas e doze cordas. A segunda, do lado direito, foi construída, segundo dados de Maria Antónia, perto do ano de 1987 por José Augusto Lobão, Angra do Heroísmo, Terceira, e é uma viola de seis ordens e quinze cordas.

os direitos de todas estas fotos são reservados. Colecção de Maria Antónia Esteves

os direitos de todas estas fotos são reservados. Colecção de Maria Antónia Esteves

Fontes usadas na pesquisa: Cantigas do Povo dos Açores, Francisco José Dias, O Baile Popular Terceirense, Machado Drumond, conversa e troca de impressões com Maria Antónia Esteves.

 

 

Viola de corações

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Viola de corações

Há praticamente 100 anos o musicólogo português Michel' Angelo Lambertini (1852-1820) referenciava este instrumento musical no Catalogo Sumario do Primeiro Nucleo de um Museu Instrumental em Lisboa (ano de 1914).

Com uma caixa estreita e comprida, uma cintura pronunciada e uma boca em forma de dois corações unidos com as pontas de fora, é assim que imediatamente a maioria das pessoas descreve uma das violas portuguesas mais características.

 

A viola tem dez cordas

Juntamente dois bordões

E acima do cavalete

Também tem dois corações

(Quadra Popular, autor desconhecido)

 

Mas, há elementos de ordem concreta e técnica neste cordofone, como sejam a sua escala composta de vinte e um trastos, dos quais doze estão sobre o braço e nove sobre o tampo. O braço é comprido, numa escala até à boca e o seu tampo é distinguido pela diferença das madeiras.

Arma com doze cordas, dispostas em cinco parcelas: as três primeiras duplas e as duas seguintes triplas.

Com uma forte predominância, do ponto de vista geográfico, em todo o arquipélago dos Açores à excepção da ilha Terceira, ilha onde apesar de alguma presença não é tão predominante, esta viola apresenta aspectos diferenciados na sua construção, afinação e encordoamento consoante a ilha.

A sua expressão transnacional não surge só no século XXI com a crescente globalização, como nos comprova a exposição com o tema: Intstrumentos musicais e viagens dos portugueses organizada no ano de 1986/7 no Museu de Etnologia em Lisboa onde era apresentada uma viola na ilha de Maio (ilha que faz parte do grupo de Sotavento. A maior povoação desta ilha em Cabo Verde é a Vila do Maio) que se aproximava da viola de dois corações: cinco ordenamentos de cordas duplas, abertura sonora em forma de dois corações, escala rasa com o tampo, com doze trastos sobre o braço. Além disso, em Junho do ano de 2007 a RDP-África apresentou um programa acerca da ilha Brava (ilha de  Cabo Verde situada no Sotavento, a oeste da ilha do Fogo e que conta com cerca de 6800 habitantes) no qual um grupo musical que actuou apresentava uma viola com este tipo de abertura sonora.

Também no Brasil, Osvaldo Ferreira de Mello cuja investigação se centrou no ''Estudo das identidades da música catarinense com origens açorianas'', há referência da presença da quase inexistente viola de doze cordas na ilha de Santa Catarina (em  documentação da Universidade Federal de Santa Catarina encontram-se estes dados) e até de um só coração. Doralécio Soares, folclorista e presidente da Comissão Catarinense de Folclore também o afirmou em entrevistas.

A viola de corações é muitas vezes confundida com a amarantina na sua figura e por ter dez trastos, mas na realidade a viola que mais proximidades tem com esta viola açoriana é a viola toeira de que já aqui lhe falei, na medida em que possuem doze cordas em cinco parcelas e afinações semehantes, exceptuando a afinação mais usada nas ilhas do grupo oriental, já a amarantina tem os dez trastos sobre o braço, alguns meio trastos suplementares e dez cordas de afinação diferente e possui ainda ornamentos distintos. Talvez as diferenças mais visíveis entre estas violas sejam o género de abertura sonora mais comum em cada uma: abertura de boca oval deitada na viola toeira, abertura de boca redonda na ilha Terceira que aprofundarei num outro texto nesta área do Portal; dois corações encostados um ao outro com a frente virada para lados opostos nas outras ilhas.

Num outro texto exporei os tamanhos e moldes a que corresponde cada uma das designações da viola de corações, bem como alguns violeiros (construtores deste instrumento), especificamente: Adelino Vicente e João Barbosa da Silva.

 

Vídeos de demonstração de execução de Violas da Terra

Vídeo 1: Foi integrado num concerto que ocorreu em Abril de 2013 na Casa do Povo de São Mateus do Pico, nos Açores. "Trinando os Dois Corações" - Carinhosas é interpretado por dois tocadores, dinamizadores e formadores de violas da terra no arquipélago: Rafael Carvalho e Orlando Martins.

Vídeo 2: Uma transcrição e interpretação de Rafael Carvalho de ''Fado Velho'', um dos temas que integra o fonograma Preciosos Imprevistos de Miguel de Braga Pimentel.


Vídeo com ligação externa de uma actuação do Conjunto Cisa - Irmãos Unidos em Cabo Verde, onde aparece a viola de corações

 

Fontes usadas na Pesquisa: Instrumentos Musicais Populares dos Açores, Ernesto Veiga de Oliveira, Centro de Documentação Museu da Música, A viola de dois Corações, Manuel Ferreira - Ponta Delgada, 1990.

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Viola Beiroa

Viola Beiroa

Na região centro do país, região da Beira Baixa, nomeadamente na zona leste do distrito de Castelo Branco, há uma viola com afinações variadas  chamada ainda, especialmente pelos mais velhos da região (tocadores e não tocadores/simpatizantes da prática deste instrumento musical), de bandurra. Não consegui identificar, por ser uma informação mutável, ou seja: que varia consoante a bibliografia e o que referem os executantes, qual é o momento/data em que se começa a designar este cordofone de viola beiroa, contudo é assim que entre os organeiros, ou os que centram o seu estudo nos instrumentos musicais tradicionais em Portugal (da área da Conservação e Restauro inclusivé), ela é chamada.

Esta viola arma com dez cordas distribuídas por cinco parcelas e com duas cordas complementares (designadas de requintas) que se encontram presas a um cravelhal que se situa no fundo do braço da viola perto da sua caixa de ressonância.

 

Um dos pormenores mais singulares deste instrumento é a afinação. Entre as afinações variáveis a mais difundida no circuito de músicos e executantes é a que é utilizada em Idanha-a-Nova: ré, si, sol, ré, lá.

As duas cordas suplementares, as requintas, possuem um comprimento curto e uma sonoridade aguda. Tocam-se habitualmente soltas e são afinadas em ré.

Um dos mais influentes  tocadores desta viola foi Manuel Moreira (imagem referente a ele na capa deste texto), cuja técnica  consistia no uso da mão direita com utilização do polegar para os 'bordões de requintas' enquanto o dedo indicador em dedilhado (expressão cujo sentido já expliquei aqui) para as fundeiras, segundas e toeiras. Movimento, aliás, com que fraseava a melodia.

Entre os colectores e folcloristas dedicados ao registo e levantamento deste instrumento destaco: Ernesto Veiga de Oliveira e Benjamim Pereira, enquanto no que toca à transcrição de algum deste repertório para este instrumento nesta região: Domingos Morais.

É ainda de salientar que uma das entidades que tem promovido este instrumento é a Associação Cultural e Recreativa As Palmeiras  através do seu Grupo de Danças e Cantares de Castelo Branco. 

Ao contrário de outras violas tem uma capacidade ilimitada de se entrosar noutros domínios que não só o da 'música tradicional', pelo que mostro duas interpretações do mesmo instrumento. Uma de Amadeu Magalhães e outra de um conjunto/orquestra de violas beiroas, que tem nos seus integrantes um dos dinamizadores activos desta viola: Miguel Carvalhinho, na interpretação de um tema tradicional assaz popular.

Biliografia usada na pesquisa: Música Popular Portuguesa, Armando Leça, Instrumentos Musicais Populares Portugueses, Ernesto Veiga de Oliveira, Transcrições de Domingos Morais, Recolhas de Benjamin Pereira

Viola Braguesa

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Viola Braguesa

As violas tradicionais de Portugal continental compreendem duas formas basilares: a viola das terras ocidentais com uma pequena cintura e a viola do leste com uma cintura mais acentuada.

Dentro da forma das violas das terras ocidentais encontramos a viola braguesa, a viola amarantina e a viola toeira acerca da qual já escrevi neste portal.

A viola braguesa, viola de Braga, ou simplesmente braguesa como se apelida mais frequentemente, é considerada uma das violas em Portugal com um maior número de simpatizantes e tocadores, o instrumento de destaque no Minho, Entre Douro e Minho. É bastante usada para tocar repertórios no domínio da 'música tradicional'  como rusgas, chulas ou desafios.

Na gíria, entre executantes, diz-se que ela se ''toca de rasgado'' (rasgueado), pelo facto de ser executada em passagens rápidas, para cima e para baixo, com auxílio das unhas, por norma na formação harmónica de tónica e dominante (Dicionário de Música, T.Borba e L.Graça, entrada ''rasgado'').

Como grande parte das violas continentais a viola braguesa tem uma escala rasa com o tampo e apresenta dez trastos sobre o braço da viola. À excepção de três dos seus bordões arma com dez cordas de aço de espessura fina tendo uma afinação semelhante à por norma usada na guitarra portuguesa (sol, ré, lá, sol, dó ou lá, mi, si, lá, ré) do agudo para o grave.

A abertura de som desta viola é oval, redonda ou, como também se diz na gíria, em ''boca de raia'', pois é caracterizada estética/visualmente como uma viola com dois olhos e uma boca que ri.

Notas:

A expressão ''Varejar as cordas'' significa que elas são tocadas com um dedo, já ''rasgar as cordas'' (rasgueado) significa que elas são tocadas com dois ou mais dedos. Na prática varejar e rasgar, dois dos termos mais usados entre os tocadores, significam dedilhar só que é possível fazê-lo com ambas as partes dos dedos: a parte de fora (unha) e a parte de dentro (polpa).

Viola braguesa por Amadeu Magalhães

Braguesa, disco de Júlio Pereira (1983)

 

Bibliografia/fontes usadas na pesquisa: Dicionário de Música, T.Borba e L.Graça, Instrumentos Musicais Populares Portugueses, Ernesto Veiga de Oliveira, Entrevista a Amadeu Magalhães para Arquivo

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Viola Toeira

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Viola Toeira

A viola toeira é um instrumento musical  inicialmente predominante na região da Beira, onde acompanhou as danças e cantigas no contexto rural da população dessa região. Na cidade de Coimbra foi durante um largo período de tempo o instrumento predilecto dos estudantes da Academia. Foi usado em serenatas até ao aparecimento da guitarra que aconteceria por volta do ano de 1850 (pág 122, Música Popular Portuguesa, Armando Leça).

Característica do centro litoral e região de Coimbra esta viola diferencia-se da viola braguesa especialmente no seu encordoamento. Arma com doze cordas alinhadas em cinco ordenamentos: as três primeiras cordas duplas e as outras triplas. Ao contrário da viola braguesa que possui dez cordas. 

A viola toeira é, sem qualquer dúvida, um dos instrumentos musicais que melhor caracteriza a ''sonoridade coimbrã'' entre os séculos XVIII e meados do século XIX.

O seu papel é de tal relevância que tanto entre a comunidade académica coimbrã como nas áreas rurais da cidade marca presença.

É comum encontrarmos outras designações quando o assunto é este instrumento. Em variada documentação sobre cordofones que se tocavam na região centro litoral, que inclui quadras populares, mencionam  “viola” e “viola de arame” (de salientar que a viola de arame, típica no arquipélago dos Açores é, com a guitarra de Coimbra, dos primeiros instrumentos a entrar no ensino), também com mais recorrência encontramos o nome “banza” associado a este instrumento.

Armando Leça (1893-1977) adoptou a denominação, comum entre os violeiros de Coimbra e usada de igual modo por um escritor/cronista conimbricense de nome Octaviano de Sá no início do século XX, de ''viola toeira'' no livro “Música Popular Portuguesa”. Também no livro ''Instrumentos Populares Portugueses” do ano 1966 da autoria de Ernesto Veiga de Oliveira voltamos a encontrá-la sob esta designação.

A identificação pelo nome atribuído a este instrumento deixa de estar confinada ao circuito de executantes/à sua comunidade de prática - violeiros, cantadeiras e versejadores -, e passa a ser usada por um maior leque de indivíduos fora desse núcleo: nomeadamente folcloristas, cronistas e também jornalistas, historiadores e poetas/ensaístas.

Além das serenatas futricas e encontros de boémios, nas romarias e festas religiosas era comum encontrá-la, como os casos: da Festa do Espírito Santo em Santo António dos Olivais, Santo Amaro, (Lages), Senhor da Serra (Semide, Miranda do Corvo), São João da Figueira da Foz, Nossa Senhora da Encarnação (Buarcos), Santa Comba (Quinta dos Melros), arraiais de São João, São Martinho do Bispo e Fala (margem esquerda do Mondego), Rainha Santa Isabel, e até à beira-rio (Mondego) em encontros de fim de tarde.

A viola toeira marcou presença tanto no domínio plebeu como nos salões e teatros. Quer os mais clássicos repertórios como as melodias mais populares nela se tocaram.

Quanto ao alcance público da sua feitura/produção destacam-se versões patentes no Museu Nacional Machado de Castro (oficina dos Brunos) e no Museu da Música (Lisboa, Estação de Metropolitano do Alto dos Moinhos, ver exemplares de José Bruno e António Augusto dos Santos).

A publicação do método de Manuel da Paixão Ribeiro no ano de 1789, onde o cordofone é associado a um repertório de salão que remete para a fidalgia e burguesia (modinhas e minuetos), e o seu fabrico na oficina dos irmãos Brunos, no Paço do Conde, nas décadas de 1850 e 1860 dão-lhe ecos de uma preocupação e exigência no que concerne ao seu contexto, estudo e fabrico.

Também no apogeu do seu destaque no seio da recepção musical (entre os executantes) por volta de 1960, salientam-se entre essa exigência e foco na credibilidade de execução/produção continuadores como os construtores/executantes  António Augusto dos Santos e  Raul Simões. Este último, que acompanhava a cantadeira Estela Abrantes revelando notável mestria na execução dos rasgados, alternados com “pancadas” de tampo. Raul Simões é referenciado, por quem conviveu com ele na sua oficina no bairro de Santana, não só pelo seu papel na  construção de violas como na mestria com que percutia e ''rasgava'' o instrumento.

Actualmente, há músicos que retomam o som e musicalidade deste instrumento. Na recolha de entrevista no âmbito deste trabalho (História Oral, 29 de Abril de 2013) feita ao músico Amadeu Magalhães ele expressa algumas das características individuais das várias violas que toca, reflectindo que há uma proximidade entre a toeira e braguesa no modo de as executar.

 

Notas

Fotografias de Violas construídas por Raul Simões.

Vídeos de execução de viola toeira por Raul Simões e viola da terra e toeira por Rafael Carvalho e Amadeu Magalhães.

Bibliografia usada na pesquisa:  Nova Arte da Viola, 1789, Manuel da Paixão Ribeiro, Música Popular Portuguesa de Armando Leça, Instrumentos Populares Portugueses de Ernesto Veiga de Oliveira, Elementos para a abordagem da Tocata Tradicional Mondeguina, Blogue Guitarra de Coimbra, de António Manuel Nunes.

Tampo em pinho, ilhargas e costas em pau rosa

Tampo em pinho, ilhargas e costas em pau rosa

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Entrevista sobre Mural Sonoro para FCSH - Universidade Nova de Lisboa

Entrevista sobre Mural Sonoro para FCSH - Universidade Nova de Lisboa

A autora do projecto Mural Sonoro foi convidada pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa para um diálogo sobre este trabalho. O resultado da entrevista foi, entre outras redes desta universidade, publicado aqui.

1)Transcrição da entrevista do Blogue da FCSH-UNL/2)Transcrição para inglês de Luís Peres

O projecto “Mural Sonoro” da responsabilidade da nossa antiga aluna Soraia Simões da Pós-graduação em Estudos de Música Popular, tem por objectivo o estudo e divulgação das práticas musicais e manifestações culturais locais em Portugal, associadas à migração e à diáspora. Leia a entrevista realizada a Soraia Simões sobre este projecto:

Como surgiu a ideia de transpor um trabalho da pós-graduação para um projecto como o Mural Sonoro?

Este Projecto começou por ser um Blogue criado em 2009 e reunia sem qualquer linha de estudo à altura um considerável conjunto de entrevistas que fui pontualmente fazendo a músicos e compositores portugueses e estrangeiros para publicações locais com as quais colaborava desde 1999 em “part-time”.

 

Com o curso que fiz e os conhecimentos científicos teórico-práticos que adquiri acerca das práticas musicais, a teoria e método da etnomusicologia e os processos de produção e recepção musical transformei esse acervo inicial numa ferramenta de utilidade não só para o conhecimento dos processos de produção e recepção musical em Portugal, como para as comunidades de prática com que me tenho vindo a envolver no contexto da Música Popular dentro de universos musicais com características próprias, que se sentem valorizadas com esse cuidado e preocupação (os construtores de instrumentos, os detentores de espólios particulares inestimáveis, os autores, os compositores e intérpretes), mas também para a grande maioria dos públicos que raramente tem acesso, julgo que devido à fraca tradição musical, cultural e científica que o nosso país tem e ao desconhecimento sobre o estudo sobre músicas e cultura popular, e a meu ver poderia, dada a forma como ia expondo as recolhas de dados, de novas entrevistas que vim a fazer, as sessões mensais de conversa de entrada livre no Museu da Música (entidade parceira) sob temas abordados nessas entrevistas, contribuindo para o aproximar desses conhecimentos e numa última instância: colocar a comunidade no geral e a institucional que pode decidir a comprometer-se com a valorização da Música como se compromete com outras culturas em Portugal num plano de desenvolvimento educativo, social, económico e até político-ideológico.

 

Tendo eu noção, analisando as reuniões de trabalho que fui tendo nos últimos dois anos por causa deste trabalho, que os últimos três itens parecem quase impossíveis de conceber na cabeça de grande parte daqueles que decidem. Mas, é algo em que acredito. Tal como acredito que seja possível o Estado deixar de olhar para a ideia de ter um Arquivo Sonoro como se de uma Fonoteca se tratasse. Talvez seja fácil de entender porque é que há tantas ‘’Fonotecas’’ ao invés de um Arquivo, à excepção da de Coimbra, não é só por uma mera questão de “linguagem apelativa ou turística”.

 

 Que expectativas tinha para o trabalho que está a desenvolver e de que forma elas foram atingidas ou superadas?

Achei no início que as comunidades de prática (considerava isso no fado por exemplo. Agora sei que era uma ideia pré-concebida) se fechavam em si mesmas, que seria muito difícil eu dialogar com os seus agentes sem esbarrar em discursos formados e impenetráveis, que eu ia ser “a de fora” e que havia uma forte probabilidade de me verem, e se eu conseguisse gravar uma que fosse entrevista, como alguém que podia ser um veículo para a sua promoção, divulgação emitindo-me apenas o que lhes interessava dizer. Estava enganada. Andei quase um ano a conviver com os tocadores, as casas de fado, os músicos, ainda hoje fico até às tantas da manhã e nem registo nada, acho até que os momentos mais descritivos são aqueles que não vão ficar registados. Não só no fado. E acho que a envolvência que assumi, o facto de ficar muitas horas a digitalizar informação e a fazer-lhes perguntas me abriu a porta de um modo que nunca esperei quando finalmente disse que queria começar a recolher entrevistas com eles. Portanto, as minhas expectativas iniciais eram apenas de reunir informações, o máximo das que conseguisse, para mais tarde ter dados que eu mesma tinha recolhido, e não baseada apenas em bibliografia alheia, para fazer uma tese.

As minhas expectativas foram mais que superadas, aprendi que tínhamos afinal todos a mesma vontade: enriquecer, contextualizar e valorizar as suas práticas e as relações de proximidade e ambiente colaborativo e quase familiar começaram a sustentar este trabalho, mais até que as horas que ainda passo de bibliografia em bibliografia. O Mural Sonoro cada vez fez na minha cabeça e na vontade que assumi mais sentido.

- Considera que este é um trabalho que ainda não estava feito? Como pensa continuar a desenvolvê-lo e expandi-lo?

Considero, sim.

E explico-lhe melhor porquê: acho que existem trabalhos cujo enfoque pode ser o mesmo, o caso da Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX sob a coordenação da professora Salwa Castelo-Branco, mas a forma como é abordado termina no momento em que a Obra é editada e publicada, no caso do Mural Sonoro há um trabalho que vive a cada dia, a cada etapa, onde há a disponibilização deste trabalho por temas que são assuntos recorrentemente levantados nas conversas gravadas, as recolhas de entrevistas gravadas e transcritas e as Sessões que ficarão na Fonoteca do Museu da Música para consultar, onde existirão publicações e registos documentais e sonoros no âmbito e onde existe uma base de dados que metodologicamente entrelaça o método etnográfico com a pesquisa bibliográfica e criação de uma nova leitura no âmbito. Estará em frequente actualização e poderá servir vários campos de acção: a investigação, as comunidades de prática, os estudantes, os autores e até os meios de difusão.

Expandir este trabalho prender-se-á com algo que desejo há muito. Ter um espaço onde situar todo o trabalho desenvolvido. Um Espaço físico que funcione como Centro de Documentação e Investigação que crie Parcerias com Universidades e Escolas do Ensino Preparatório e Secundário, além da que tenho desde o ano de 2013 com o Museu da Música onde as sessões mensais se realizam.

Um Espaço que na sua base tenha o Arquivo do Mural Sonoro com as entrevistas na íntegra, as transcrições, etc. e um auditório onde exposições de instrumentos que foram gravados, apresentações de construções de instrumentos, aulas com alguns dos músicos gravados, aulas de instrumentos específicos para crianças que não têm acesso ao ensino musical gratuitamente, congressos no âmbito, pequenos espectáculos e intercâmbios com músicos e investigadores estrangeiros possam acontecer.

Um objectivo que dependerá de conseguir ou não esse espaço na cidade de Lisboa. Uma Associação já temos. Foi feita esta semana e nela estão sócios sem vínculos e fundadores que formam o corpo de trabalho que vivem em Portugal e no estrangeiro (Brasil, Londres, Hong Kong) com os quais tenho colaborado e eles comigo.

- Qual tem sido o aspecto mais gratificante na elaboração do Mural Sonoro e na sua divulgação através de site e redes sociais?

O reconhecimento que o trabalho foi tendo, especialmente no meu campo de trabalho, e o facto de parte do trabalho, já que só parte é disponibilizado online, servir como uma das fontes sobre práticas musicais em Portugal, sobretudo as de cariz profissionalizante, para Investigadores, com os quais tenho trocado experiências, da Universidade de Campinas, em São Paulo.

Project 'Mural Sonoro' 

Published 17 February, 2014 by FCSH/NOVA

 

The  project  'Mural  Sonoro,' the responsibility  of  our  former  postgraduate student  in  Estudos  de  Música Popular [Studies  in  Popular Music]  Soraia  Simões,  aims  at studying  and  promoting musical  practices  and cultural expressions associated with migration and the diaspora. Read the interview with Soraia Simões about this project.  

 

‐ How did the idea of developing your post‐graduate work into a project like Mural Sonoro come about?   

This  Project started  out  as  a  blog  created  in  2009  and  it  comprised,  without  any  adequate  investigative approach, a considerable amount of interviews with Portuguese and foreign musicians and composers which were regularly conducted by me and were destined to local publications with which I had been in part‐time collaboration since 1999. 

Through  my  degree  and the  knowledge that  I  gained  – scientific, theoretical  and  practical  –  of  musical practices, the theory and method of ethnomusicology, and the processes of musical production and reception, I changed this initial collection into a user tool. My aim with this tool was beyond facilitating knowledge about the production and reception of musical processes in Portugal; I also wanted it to be used by the musical communities with whom I've been involved in the context of Popular Music within particular musical spheres, who feel  valued  by the  care  and  concern (the  instrument makers, the  holders  of  particular  heritages  of inestimable value, the authors, composers and interpreters). Additionally, it was also meant to be used by the great number of audiences who seldom have access to this kind of information – probably on account of the poor musical, cultural and scientific background in our country, as well as the lack of awareness regarding the study of music and popular culture. I believe they could gain this access through exposure to the data, the new interviews conducted by me, the monthly talks at the Museu da Música [Music Museum] (our partner entity) which  are free  of  charge,  on themes discussed  in those  interviews.  These  have been  contributing to the narrowing of the distance between the audiences and this knowledge, ultimately placing the community in general, and the professional, who may decide to commit themselves to valuing Music in the same way as they commit  to  other  cultures  in  Portugal,  within  an  educational,  social,  economic,  and  even  political  and ideological development strategy.  

I'm well aware, upon considering the work meetings attended in these last two years whilst working on this project, that the last three items seem almost impossible to take shape in the mind of the majority of those calling the shots. But this is something I believe in – as I also believe that it's possible for the government to start conceiving the idea of a Sound Archive as something more than an audio library. Perhaps it's not so difficult to understand why there are so many "audio archives" instead of an Archive, apart from the one in Coimbra. It's not merely an issue of 'catchy or touristic parlance.' 

‐ What were your expectations regarding the work you're doing and to what degree were they fulfilled or exceeded?   

In the beginning I had a preconceived idea that musical communities (I thought in this way about fado, for instance) tended to build a wall around themselves; that it would be quite difficult to engage in a dialogue with their agents without clashing against fixed and indecipherable discourses; that I would always be seen as 'the outsider' and that there was a strong probability of being seen ‐ and this even if I did manage to record a single interview  ‐ as someone who might be a useful vehicle for self‐promotion, with the result of being told only what was in their interest to divulge. I was wrong. I spent almost one year among instrument players, fado houses, and musicians – as I still do – often until the early hours in the morning, without making any records. I even think that the most illustrative moments are those which won't end up in the archive. And this didn’t only happen within the fado community. I also believe that by way of my commitment, by the fact that I've spent many hours digitising information and asking them questions, I had the door opened to an extent I never expected when I finally informed them of my plan to start gathering interviews. So, my initial expectations were only to gather information, as much as I could, so that later I could have my own data, instead of other people's bibliographies, to complete my thesis.    

I  far  exceeded  my  expectations.  I  discovered  that,  after  all,  we  entertained  the same  wish:  to  enrich, contextualize and value their practice. And the intimacy, as well as the collaborative and almost family spirit we achieved, began sustaining this work, even more than the hours I still spend jumping from one biography to another. As my ideas became clearer and my determination stronger, the project Mural Sonoro began to make ever more sense.   

‐ Do you consider this work to be absolutely innovative?  How are you planning to develop and expand it?  

Yes, I do.  Let me explain why: I believe that there is already work which may focus on the same, such as the Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX [Music Encyclopaedia in Portugal in the XX Century], overseen by Salwa Castelo‐Branco, but the effort stops after the work is published. It's different with Mural Sonoro where there is an ongoing  effort, step by step; where the recurrent subjects raised  in our recorded meetings  are made available, the  collection of interviews which are recorded and transcribed, and the Sessions which will be archived  and  available to the  public  in the  audio  library  at the  Museu  da  Música;  where there  will  be publications as well as audio and physical archives within that framework; and where you can find a database where the ethnographic method and the bibliographic research combine to produce a new take on this field.             

This will be  continuously updated and it may be useful for different fields of action: for research, for the practice communities, for students, for authors and even for media broadcasts.  

Expanding this work  is something  I've been wishing to do for  a  long time.  To have  a space where  I  can assemble all the work produced. A physical Space that works as a Documenting and Research Centre that allows me to create partnerships with Universities, Prep and Secondary Schools, beyond the work I've been doing with the Museu da Música since 2013 where the monthly sessions are held.    

A  Space based on the Archives of the Mural Sonoro, with all the interviews, transcriptions, etc., and anauditory where we could exhibitthe instrumentsrecorded, have workshops on constructing instruments, offerlessons by some of the musicians in the archive, as well as lessons on specific instruments for children who don't  have  access  to  free  musical  education,  conferences  within  the  field, small  performances,  and  an exchange programme with musicians and researchers from abroad.  

This is a goal dependent on whether I manage to get facilities in the city of Lisbon or not.  We already have an Association. It was created this week and its members include partners without contractual obligations and founder members living in Portugal and abroad (Brazil, London, Hong Kong) with whom I've collaborated.

‐ What was the most gratifying aspect so far of building and divulging Mural Sonoro via websites and social networks?  

The recognition thework has been receiving, especially in my field of work, and the fact that that part of the project, since only a part of it is available on‐line, is being used as one of the sources concerning musical practices in Portugal, particularly those of a professional nature, used by researchers with whom I've been exchanging experiences, from the Universidade de Campinas in São Paulo.  

Luís Peres, London Metropolitan University, trad.

Gramofone

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Gramofone

Com a invenção do gramofone por Emil Berliner no ano de 1888  e a concorrência de outro formato: os discos de goma-laca, o fonógrafo inventado por Thomas Edison entra em declínio.


O circuito de comercialização de  cilindros foi diminuindo e o dos discos aumentando. No início, não porque o fonograma (o disco) fosse um meio  com melhor "qualidade" que o cilindro, mas especialmente porque o fonograma/disco suplantava as dificuldades técnicas da reprodutibilidade das gravações e  das dificuldades do cilindro enquanto produto.


O disco possibilitava ainda a prensagem como técnica de reprodução em massa, além de que o cilindro não permitia selos fonográficos, não tinha espaço para capas e dois cilindros com a mesma música do mesmo músico não eram exactamente semelhantes, na medida em que a sua reprodução exigia várias gravações por parte dos músicos. Era consideravelmente limitado o número de cópias que podiam ser feitas a partir de um cilindro.


Em 1912, a Edison Records (editora de Edison) passou a comercializar discos e aparelhos que tocavam esses discos.


O gramofone, do alemão Emil Berliner, e o disco de 78 rpm transformaram-se à época no padrão do mercado mundial, que só seria suplantado  com a invenção das gravações eléctricas em 1925, às quais Edison não adere até Junho de 1927, quando já era tarde e a grande depressão provocava a falência da sua companhia discográfica  (Edison Records) em Outubro de 1929.


Em contraste com o cilindro de Thomas Edison, o gramofone incluía um disco giratório coberto com cera, goma laca, vinil, cobre, entre outros, onde eram, através de uma agulha, gravadas vibrações de um som emitido e afunilado numa corneta, interligada a uma membrana, que sustentava a agulha. 


Com a emissão do som, o ar movimentava-se vibrando essa espécie de 'membrana laminada' que por sua vez fazia a agulha riscar em forma de ondas a superfície do disco que ia girando.

Ao girar o disco  de forma inversa já riscado com outro tipo de agulha em contacto, esta lia-o e transmitia as vibrações para a membrana referida. As vibrações, amplificadas pela corneta, emitiam o som.

 

Som gravado durante recolha de entrevista a Nuno Siqueira acerca da sua Colecção. Toca Ercília Costa no gramofone.

Caixa com agulhas, Velharias, Jardim da Estrela, Lisboa

Gramofone, Antero Santos, Velharias no Jardim da Estrela, cidade de Lisboa

Gramofone, Antero Santos, Velharias no Jardim da Estrela, cidade de Lisboa

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Fonógrafo

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Fonógrafo

O fonógrafo é um aparelho que foi criado  no ano de 1877 por invenção de Thomas Edison. Tinha como objectivo principal  a gravação e reprodução de sons através de um cilindro. Foi o primeiro aparelho capaz de gravar e de reproduzir sons. 

Antes do fonógrafo, houve um conjunto de invenções que tentaram cumprir a gravação de forma mecânica usando para tal as vibrações sonoras. O caso do  vibroscópio inventado por Thomas Young, que foi o primeiro a traduzir as vibrações sonoras sob representação gráfica analógica utilizando, para o efeito, como meio um cilindro, ou do fonoautógrafo inventado por Leon Scott, o qual utilizava já um sistema semelhante ao que viria mais tarde a ser utilizado pelo fonógrafo de Edison: um cone acústico  para captar o som e fazer vibrar um diafragma localizado no final do cone. Sob a vibração do diafragma uma agulha gravava sinais num cilindro que representavam as ondas sonoras que se propagavam no ar. Na realidade, eram  aparelhos criados em que a principal preocupação era a de  executar representações gráficas das ondas sonoras, de modo a possibilitar estudos de acústica, sem  pretensão de  reproduzirem o som gravado para quaisquer fins comerciais.

Ao contrário destas e outras tentativas, o fonógrafo assume ainda a capacidade de também reproduzir os sons que gravava, incitando a novas leituras e possibilidades, como a hipótese de comercialização dos sons.
Só com a informação descritiva de Charles Cros do parleofone é que a preocupação com a gravação e a reprodução do som gravado no mesmo aparelho começa a ganhar força e é suplantada por T.Edison na medida em que, apesar do alerta de C.Cros este nunca chegou a conceber as suas ideias.


Os impactos da invenção do fonógrafo na História da Música são notórios. O aparelho anunciado por T. Edison no final do ano de 1877  foi apresentado ao público e assumiu-se ao longo das décadas seguintes e até hoje como um feito notável nos finais do século XIX.


O aparelho que congregava um cilindro com pequenos sulcos era revestido por uma folha de estanho. Uma ponta aguda era pressionada contra este cilindro e na ponta oposta estava um diafragma (uma membrana circular, cujas vibrações convertiam sons em impulsos mecânicos e vice-versa) acoplado a um bocal de grande dimensão em forma de cone. O cilindro era girado manualmente e, à medida que o operador  falava para esse  bocal, a voz fazia o diafragma vibrar, o que permitia a ponta aguda criar um sulco parecido na superfície do cilindro. Quando a gravação estava completa, a ponta era substituída por uma agulha e o cilindro era girado no sentido contrário: a máquina desta vez reproduzia as palavras gravadas e o cone amplificava o som.


O aparelho foi patenteado em 1878 e apresentou, apesar de tudo, dificuldades no início da sua comercialização. Houve pouco interesse da parte de músicos e editores e T. Edison chegou a recusar a utilização da sua invenção  para fins de entretenimento, acabando por se dar prioridade à lâmpada incandescente.


Só quando Charles Tainter e Alexander Graham Bell, já no ano de 1886, aperfeiçoam a invenção de Edison, criando o cilindro removível (uma vez que até então o meio usado na gravação encontrava-se fixo ao aparelho) e mudando a sua composição para papelão coberto com cera, é que T.Edison resolve voltar a trabalhar na sua criação inventando um cilindro feito inteiramente à base de cera (resolvendo o problema da fragilidade do cilindro que rachava devido à dilatação diferente dos materiais em resposta ao calor).


Duas empresas  foram formadas para explorar o cilindro e, no final da década, a comercialização deste e outros aparelhos e de cilindros virgens e gravados com música ou palavra falada começou a dar lucros significativos nos Estados Unidos da América.

 

Aparelho registado durante recolha de entrevista com Nuno Siqueira acerca da sua Colecção.

Aparelho registado durante recolha de entrevista com Nuno Siqueira acerca da sua Colecção.

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Joel Pina (violista de fado, instrumento: viola baixo)

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Joel Pina (violista de fado, instrumento: viola baixo)

76ª Recolha de Entrevista

Quota MS_00045 Europeana Sounds

Nasceu há 94 anos numa aldeia de nome Rosmaninhal (Idanha-a-Nova). É  um dos nomes há mais tempo ligados à história do fado, especialmente pela integração da viola baixo no conjunto de instrumentos de acompanhamento do fado, e pelo seu talento interpretativo como executante do instrumento viola baixo. Profissionalizou-se no ano de 1949 e ainda hoje toca e actua.

Nesta recolha de entrevista maior de que se disponibiliza online uma parte recua até ao Rosmaninhal onde o seu interesse por instrumentos de cordas começou, expressa os primeiros contactos com o fado, e o primeiro instrumento que com 8 anos começou a tocar, comprado pelo pai numa viagem a Lisboa: um bandolim, tocou ainda viola e guitarra mas foi na viola baixo que detectou o talento que tinha como executante e acompanhante de fado, diz na recolha que apesar de saber música, ''o fado tem uma música própria'', reflecte ainda sob as condicionantes da sua aprendizagem autodidacta feita através da observação dos outros que tocavam.


No ano 1938 mudou-se para Lisboa e, como apreciador de fado, passou a ser presença assídua no Café Luso. Casa de Fados onde conheceu Martinho de Assunção que, em 1949, o convidou para integrar o Quarteto Típico de Guitarras de Martinho de Assunção, que intitula de ''um conjunto de exibição'', devido especialmente ao repertório clássico que tocavam.  É precisamente neste conjunto que Joel Pina se começa a dedicar à viola baixo e, tal como anteriormente referido, se profissionaliza como músico.

Em 1950 integrou o elenco da Adega Machado, com Francisco Carvalhinho, na guitarra, e Armando Machado, na viola. A presença da viola baixo no acompanhamento instrumental do fado, que até essa altura não era habitual, através de Joel Pina manteve-se no elenco desta casa durante dez anos.


Foi, com Fontes Rocha e Júlio Gomes um dos integrantes e fundadores do Conjunto de Guitarras com Raul Nery. Nesta recolha fala do alcance granjeado pelo Conjunto que chegou, por iniciativa de Eduardo Loureiro - chefe então do departamento de música da Emissora Nacional, a convite de Raul Nery para formar um conjunto, a apresentar-se na rádio, quinzenalmente, num programa de guitarradas.

A partir do ano de 1966 começou a acompanhar regularmente Amália Rodrigues, actividade que manteve ao longo de três décadas até ao final do percurso musical da fadista. Com ela tocou em palcos de todo o mundo, em inúmeros espectáculos e digressões que passaram, em exemplo, pelo Canadá, Estados Unidos e Brasil (diversas vezes), Chile, Argentina, México, Inglaterra, França, Itália (diversas vezes), Rússia, Japão (onde estiveram cinco vezes), Austrália, África do Sul, Angola, Moçambique, Macau, Coreia do Sul.

Joel Pina é chamado de ''O Professor'' pelo seu conhecimento, experiência e dedicação ao universo do fado.

2014 Perspectivas e Reflexões no Campo

 

Curiosidades:

A primeira audição no universo do fado de Joel Pina foi numa Grafonola de um vizinho na aldeia do Rosmaninhal quando tinha 8 anos de idade: ''Fado Proença'' cantado por Maria Alice.

O último espectáculo dado por Amália Rodrigues, no Coliseu, foi organizado por Ruben de Carvalho (do Partido Comunista Português)

 

 

Recolha efectuada no Museu do Fado
Som de Paulo Lourenço
Fotografias de Marta Gonçalves

 

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